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A partir de uma moda autoral que traz referências da negritude, buscando gerar identificação da própria comunidade, estilistas negros conquistaram um nicho de negócios e começam a entrar na mira de grandes redes varejistas.

Felipe Abreu, de 25 anos, chamou atenção da Renner após fazer sucesso com a marca Chain Break. Em 2019, enquanto cursava Design de Produto na Universidade Federal Fluminense (UFF), o jovem encontrou na moda uma forma de ganhar dinheiro para poder se manter na faculdade.

— Fui a primeira geração da minha família a ingressar no ensino superior, e a marca era uma forma de me manter na faculdade, ajudando com custos de passagens e alimentação.

Com peças idealizadas, desenhadas e produzidas por ele, Abreu fazia a escolha das matérias-primas, cortava os tecidos, realizava testes de modelagem e levava para costureiras de seu bairro. As redes sociais foram o meio de tornar as peças conhecidas:

— Na pandemia, no meu segundo lançamento de coleção, minhas peças viralizaram pela primeira vez na rede social.

Logo depois, Abreu foi um dos três selecionados pela Renner para participar de um programa de trainee de aceleração para designers de todo Brasil, o que o fez dar uma pausa nas vendas da Chain Break. Agora, ele faz suas criações para a gigante do varejo.

— Estou aproveitando ao máximo essa oportunidade — comemora Abreu.

Claudio Goldberg, professor de Gestão Estratégica de Negócios da FGV Brasil, ressalta a crescente demanda por produtos que tragam representatividade:

— Os consumidores, especialmente os mais jovens, estão cada vez mais em busca de marcas que vão além do comercial e que reflitam valores autênticos e identidade.

Mas ele alerta que, apesar das novas possibilidades criadas no ambiente digital para esses empreendedores, ainda existem barreiras estruturais, sociais e econômicas que dificultam o crescimento dessas marcas.

— O varejo tradicional continua desempenhando um papel central na inserção dessas marcas em uma escala maior, mas muitas vezes elas enfrentam falta de acesso a financiamento e capital de giro — completou.

Walter Machado, de 31 anos, criou a Crokuto em 2020, durante a pandemia de Covid-19, quando saiu de seu antigo trabalho em uma farmácia e resolveu ter seu próprio negócio.

— Eu tive a ideia de criar a marca para fazer regatas, porque sempre gostei do estilo do hip-hop, do basquete, via os caras com aquelas camisetas brancas, apertadas, que combinavam com tudo. A gente tinha acesso, mas a qualidade não era boa. Eu comprava nessas lojas de departamento, mas assim que você lavava, ela já esticava ou encolhia.

Foi então que ele comprou os tecidos, usou regatas antigas como molde e pediu a mãe de um amigo para costurar. Assim surgiu a Crokuto.

— Eu também criei a marca para as pessoas negras terem acesso a um produto de qualidade. Para uma pessoa que veio da favela, como eu, não precisar só comprar de empresas brancas. Olhar para dentro da comunidade e ver que tem algo de qualidade lá. E eu procuro modelos negros, porque a indústria sempre foi voltada para corpos brancos. Na minha marca, eu quero pessoas iguais a mim.

Em 2021, a marca começou a fazer sucesso e Machado aumentou o portfólio, fazendo camisas de manga, macaquinhos, tops e shorts. Além das vendas on-line, a Crokuto está presente na Feira da Glória, que acontece na região central do Rio de Janeiro aos domingos, e tem um ponto de vendas no centro do cidade. O faturamento anual gira entre R$ 50 e 60 mil.

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— As redes sociais democratizaram o acesso ao mercado, permitindo que os jovens negros possam se conectar diretamente com seus públicos sem precisar de grandes investimentos em publicidade tradicional — avalia Adriana Barbosa, CEO da PretaHub, plataforma de incentivo ao empreendedorismo afro-latino.

Assim, essas iniciativas têm atraído um público cada vez mais engajado, o que resulta em uma base de consumidores fiéis. Foi pensando nisso que Adriana criou o Festival Feira Preta, o maior evento de cultura negra e economia criativa da América Latina que, na edição deste ano, em São Paulo, reuniu mais de 150 empreendedores e movimentou R$ 1,4 milhão.

Juan Calvet, artista de 25 anos, é cliente dessas marcas nascentes. Compra suas roupas da H.A.N.C.S, de Anderson Bispo, de 24 anos.

— Eu busco apoiar artistas independentes e meus amigos. As marcas tradicionais não fortalecem a gente; eu fortaleço quem me fortalece — diz Juan.

Ele começou a se conectar com essas marcas através das redes sociais e indicações de amigo. E agora prefere garimpar peças em brechós e apoiar estilistas independentes a fazer compras no varejo tradicional:

— As marcas que compro sempre tiveram modelos negros e são feitas por negros também, o que me incentiva a apoiar essas iniciativas.

A H.A.N.C.S. (Habitat of Artist ‘N’ Creative Shelter), que significa “Habitat para Artistas e Refúgio Criativo”, foi criada por Anderson Bispo para compartilhar suas criações focadas em streetwear e voltada para jovens.

— Nosso público é diversificado, mas eu notei uma predominância de consumidores pretos e pardos. Acredito que isso se deve à identificação comigo, que sou o dono, e os modelos das campanhas — explica.

As redes sociais desempenharam um papel crucial na expansão da H.A.N.C.S, permitindo que a marca alcançasse clientes em outros estados, como São Paulo, Espírito Santo e Bahia.

— Sem as redes sociais, isso não seria possível — afirma Anderson, que planeja manter o foco no digital por enquanto, sem perspectiva para expandir para lojas físicas.

* Estagiário sob supervisão de Danielle Nogueira

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